sábado, 26 de setembro de 2009

DA DESILUSÃO A ESCRAVIDÃO


Há pouco tempo fui procurado por um colega de turma que depois de 23 anos dedicados exclusivamente a odontologia, decidiu mudar de ramo e aventurou-se em uma profissão diferente da sua formação formal. Aos 46 anos, desiludido com a falta de perspectiva profissional, desfez-se de seu consultório e dos seus sonhos, acalentado por anos a fio de estudo e qualificação. Com contas a pagar e uma filha para criar, submeteu-se a um emprego de segunda classe, muito aquém da sua capacidade intelectual, deixando de lado preconceitos e criticas mordazes de seus familiares. Durante dois meses, fez vários cursos na área da segurança privada e diferenciou-se ainda mais, afinal, além de curso universitário, exceção na área de segurança, ainda por cima, era oficial do exército com larga experiência. Conseguiu o seu primeiro emprego trinta dias depois, como segurança patrimonial em um restaurante de luxo, apostando que seria uma vitrine para a sua ascensão na área. Durante quatro longos meses passou por todo tipo de humilhação jamais imaginado. Sentiu na pele o desprezo e a invisibilidade que esses profissionais possuem junto às pessoas comuns. Boa pinta, falante, inteligente, cortes e muito comunicativo, ficava em pé, estático e incomunicável por 9 horas a fio, sob o olhar de desprezo por parte dos clientes que o enxergavam como uma ameaça iminente e não como um profissional cumprindo o seu papel. A compensação vinha no final do mês através de um contracheque bem polpudo no valor de R$900,00,incluído vale refeição,vale transporte e assistência médica para ele a para a filha.
Como um verdadeiro guerreiro, concluiu que alguém com as suas qualificações, jamais conseguiria algo melhor, afinal, em uma área onde se exige somente o ensino fundamental para exercer a profissão de vigilante, ele era um PHD de Harvard. Decidiu então fazer o caminho inverso e voltar a clinicar, mais a realidade que encontrou, não foi menos cruel.
O fim da escravatura no Brasil deu-se no século XVII em 1888, 23 anos depois dos Estados Unidos. Em 122 anos desde a sua promulgação, tenho a sensação de que nada mudou, ou melhor, mudou, passou da forma acintosa e vergonhosa para a forma velada. A relação de trabalho para com os dentistas, ao meu ver, não poderia ser mais cruel e imoral.Esqueça os anos de estudos e o investimento empregado, as horas de sono e lazer desperdiçados em busca do sucesso.Quando a oferta de qualquer profissional seja na área que for, superar a demanda, quem da às cartas é o mercado.
Colegas bem sucedidos, empresarialmente falando, oferecem subempregos a módicos 30 a 40% de comissão para o atendimento de seus convênios, oferecendo em troca, absolutamente nada. Não existe um contrato de trabalho formal, que de garantias que receberá no final do mês o justo e correto.Carteira assinada, vale transporte, vale refeição, assistência médica e adicional de insalubridade nem pensar.Exigem que se faça o atendimento através de um planejamento pré-estabelecido, não permitindo questionamento técnico, ético,legal ou moral.Exigem qualidade e dedicação por parte do profissional, desde que faça o atendimento em 20 minutos e do jeito deles, afinal, a sala de espera esta cheia e a fila tem que andar.Tempo é dinheiro!
Com excesso de profissionais no mercado e consultórios a míngua incapaz de prover nossas necessidades mínimas, nada mais lógico e porque não dizer, justo, do ponto de vista deles. Ou o dentista se submete a subempregos na área, ou muda de profissão. Nos dois casos é lamentável. É como esse meu amigo diz: “ para ganhar o que os convênios e os colegas estão dispostos a pagar, é melhor ser diarista do que dentista...”...

Pense nisso!

Um comentário:

  1. Adorei ....
    é bem assim que me sinto, formada em Psicologia, com vasta experiência Profissional, e só encontro as portas fechadas, durante 8 anos atuei em uma Cooperativa...ganhava em média 800,00 , no ultimo pagamento recebi liquido R$ 37,60...joguei a toalha no chão, a ESCRAVATURA realmente acabou...sem FGTS, sem auxilio desemprego, com aluguel, contas e filho para cuidar EU TO CORRENDO ATRAZ....tento pensar num futuro melhor, entâo...
    To correndo..!@!
    Eliana Albquerque dos Santos

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